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Inspirada em Brasília, São Paulo implanta o gesto do pedestre

Na sua quarta fase, o Programa de Proteção ao Pedestre de São Paulo coloca agentes a paisana em cruzamentos sem sinal de trânsito para adestrar os transeuntes.

Marina Lemle

A pessoa estende o braço com a mão espalmada sobre a faixa de segurança e o veículo que se aproxima desacelera até parar. O pedestre atravessa tranquilamente e o carro retoma seu movimento. A cena do cotidiano europeu poderá tornar-se realidade em São Paulo caso os esforços de educação no trânsito empreendidos pela Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CET-SP) derem o resultado esperado.

Em 2010, 630 pedestres morreram na capital paulista e em 2011 este número caiu apenas 2%, com 617 mortes, apesar do lançamento do Programa de Proteção ao Pedestre (PPP) em maio de 2011. Já no primeiro semestre de 2012 em relação ao mesmo período de 2011, observou-se uma redução de 18% nas mortes de pedestres.

Em sua quarta fase, iniciada em outubro de 2012, o PPP concentra o foco na educação de quem anda a pé, estimulando que o cidadão exerça a sua preferência no trânsito. O objetivo é fazer com que os cidadãos adquiram o hábito de fazer o chamado “gesto do pedestre” para indicar ao motorista a sua intenção de atravessar onde há faixa de segurança, mas não sinal de trânsito.

A campanha também estimula o pedestre a cruzar a via somente na faixa e a obedecer as luzes, onde houver. Como material de apoio, foram espalhadas faixas de vinil e banners nos oito subcentros com dizeres: “Motorista – Atenda o Gesto do Pedestre – Dê a preferência na travessia”, “Vamos juntos reduzir os atropelamentos neste bairro”, “Antes de atravessar, estenda a mão”, “Faça sua parte: espere o sinal verde” e “Pedestre, atravesse na faixa”.

Efeito ‘macaco de imitação’ para reforçar a cidadania

O foco inicial são faixas de travessia sem sinal de trânsito dentro da área compreendida pela Zona de Máxima Proteção ao Pedestre (ZMPP) Centro/Paulista. Foram contratados 1.350 orientadores de travessia, que se distribuem em oito subcentros: Pinheiros, Lapa, Santana, Largo 13 de Maio (em Santo Amaro), Vila Maria, Brás, Penha e São Miguel Paulista. A partir de novembro, o programa se intensificará na área central e se estenderá a 14 corredores críticos de atropelamentos, a maioria na periferia (avenidas Sapopemba, Marechal Tito, M´Boi Mirim, Teotônio Vilela, Inajar de Souza e São Miguel, entre outras.)

Para que os transeuntes assimilem e utilizem o gesto como recurso de comunicação dos os motoristas, orientadores à paisana (sem uniforme) ficam repetindo o gesto em faixas de vias movimentadas. Em outras, mímicos munidos de mãos gigantes atraem a atenção das pessoas.

A questão é: será que isso funciona?

É interessante, neste respeito, analisar a experiência de Brasília, que, com quatro pedestres mortos em faixas de pedestres em 2011, serviu de exemplo para a iniciativa paulista.

Brasília, pioneira na adoção do gesto do pedestre

Em 1996, mais de 600 pessoas haviam sido atropeladas na cidade. Para mudar esse quadro, no dia primeiro de abril de 1997, o então governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque, lançou uma campanha educativa que propunha que, quando um pedestre sinalizasse a intenção de atravessar estendendo o braço sobre a faixa, os motoristas parariam os veículos.

Pedestres passaram a receber orientação de instrutores nas faixas para fazer o gesto a uma distância de dois a 50 metros do veículo e levando em conta a visibilidade, a distância e a velocidade dos automóveis. Simultaneamente, foram realizadas campanhas de educação de motoristas de ônibus e táxis, além de uma fiscalização maior, com multas para quem não parasse diante de um pedestre sinalizando. A imprensa divulgou a ideia e nas escolas foram distribuídos panfletos, para que as crianças educassem os pais.

Lançada no “dia da mentira”, a campanha “Sinal de Vida” foi alvo de piadas, mas deu certo e os atropelamentos diminuíram muito. Em artigo no Correio Braziliense em 2009, o professor da UnB e senador Cristóvam Buarque, contou que, no começo, poucos acreditavam que as faixas seriam respeitadas, mas a mobilização cultural levou a uma mudança de mentalidade, transformando uma ideia em um comportamento social. “Muitos temiam o desrespeito, com riscos de acidentes e mortes. Aconteceu o contrário: todos os motoristas passaram a respeitar, todos os pedestres passaram a usar, toda a população passou a se orgulhar”, registrou.

Buarque critica a posterior colocação de sinais luminosos nas faixas. “Mesmo se o pedestre detiver o poder ao acender a luz vermelha para o motorista parar, ele não aumentará a cidadania coletiva. O pedestre passa a exercer um poder sobre o motorista, que passa a ser um submisso, não um participante do processo de cidadania. A faixa de pedestre é a combinação respeitosa entre o pedestre e o motorista; o sinal de trânsito é a submissão controlada de ambos, uns submetidos ao risco do atropelamento, outros ao risco de multa, se não atenderem à cor da luz. O Estado põe ordem, imposta a todos.”

Em 2012, o respeito ao pedestre parece ter se fragilizado no Distrito Federal. Até 31 de agosto, sete pessoas morreram enquanto atravessavam na faixa, mesmo total registrado em 2010 e quase o dobro do ano passado. A média mensal de mortes nas faixas de pedestres em 2012 já supera a de 2009, ano em que a estatística do Detran aponta 11 óbitos. Mesmo assim, o respeito ao pedestre na capital brasileira ainda supera em muito o de grandes metrópoles como São Paulo e Rio.

Opesquisador de Transportes da Universidade de Brasília Artur Morais afirma que a educação no trânsito deve ser contínua, assim como a fiscalização e o cuidado com a sinalização, a pintura das faixas e a sua iluminação. Ele diz que muitos motoristas em Brasília ainda não param na faixa e que há pedestres que confiam mais do que deveriam no seu direito à prioridade, não esperando os carros pararem para atravessar. “Às vezes ele não sabe que não está sendo visto pelo motorista. Isso acontece muito”, conta. Por outro lado, muitos motoristas param quando vêem pedestres próximos à faixa, e só depois percebem que eles estavam apenas esperando no ponto de ônibus.

Por estas razões, Morais acredita que o gesto do pedestre seja um recurso importante de comunicação entre motoristas e pedestres e defende a realização de campanhas nesse sentido. “Qualquer tipo de iniciativa de educação é válida, porque o pedestre precisa ser treinado e informado”, afirma. Ele discorda de quem critica o gesto justificando que o Código de Trânsito dá prioridade ao pedestre na faixa independentemente de qualquer sinal. “Tenho dúvidas sobre se o brasileiro já estaria educado para isso. O cidadão é ‘(de)formado’ no trânsito”, ironiza.

Para Morais, o gesto pode funcionar em metrópoles como São Paulo, assim como funciona em Londres. “A questão não é o tamanho da cidade, mas da cidadania”, conclui.

Mais informações:

Nova fase do Programa de Proteção ao Pedestre dá ênfase à educação de quem anda a pé – CET-SP

Mortes de pedestres caem 28,3% em oito anos, mostra CET em balanço inédito – CET-SP

Programa de Proteção ao Pedestre – CET-SP

CET divulga novas ações, números de redução de mortes por atropelamento e pesquisas de comportamento do Programa do Pedestre

Como melhorar as condições para andar a pé nas cidades: propostas básicas ao nível mundial, por Philip Anthony Gold, Ombudsman de Segurança de Trânsito da CET/São Paulo
Visão de segurança de trânsito, primeiras observações: circulação a pé - avaliação das condições de oferta de segurança no trânsito, por Philip Anthony Gold, Ombudsman de Segurança de Trânsito da CET/São Paulo

Avaliação de comportamentoprioridade do pedestre na travessia - levantamento da percepção de condutores e pedestres sobre ocomportamento do pedestre enquanto aguarda a travessia –CET-SP

Gesto do pedestre - exigência de um direito - não está sendo utilizado – Estudo da pesquisadora Lilian Rose, da CET - SP

Prefeitura de SP culpa pedestres por desrespeito à faixa – Artigo de Daniel Santini em O Eco

Deu zebra na campanha de defesa de pedestres de SP - Artigo de Daniel Santini em O Eco

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